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AS BEM AVENTURANÇAS - PARTE 3


As Bem-Aventuranças – Parte 3 






por Thomas Watson  (1620-1686)
Traduzido, reduzido e adaptado do original em inglês, em domínio público, pelo Pr Silvio Dutra  
 “Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra.” (Mt 5.5).
 Nós veremos agora o terceiro passo que conduz à bem-aventurança: a mansidão cristã. Esta mansidão tem um aspecto duplo, a saber, mansidão para com Deus e mansidão para com o homem.
Na mansidão para com Deus duas coisas são insinuadas: submissão à Sua vontade; e dobrar-se à Sua Palavra.   
A submissão para com Deus ocorre quando nós calmamente nos deixamos levar debaixo das dispensações da Sua providência, sem murmurar nas provações, ou sem nos incharmos de orgulho espiritual nas bênçãos recebidas.
Deus provê o que é melhor para mim, seja numa terra fértil ou estéril.  
É espiritualmente submisso aquele que se conforma à mente de Deus, e não disputa com as instruções da Palavra, mas com as corrupções do seu coração. E quão feliz é isto, quando a Palavra vem com majestade e é recebida com mansidão! (Tiago 1.21). 
Quanto à submissão em relação ao homem, isto é uma graça concedida pelo Espírito Santo para que nós possamos moderar nosso temperamento. A mansidão e o domínio próprio são fruto do Espírito (Gál 5.22,23). Por natureza o coração está como um mar agitado, enquanto lança a espuma de raiva e ira adiante de si, mas a mansidão acalma as paixões. Ela se assenta como um juiz moderador na alma, enquanto a aquieta.. A mansidão de espírito não somente nos ajusta para a comunhão com Deus, como também para a conversação civilizada com os homens. E esta mansidão consiste basicamente em três coisas: suportar danos; perdoar danos, e recompensar o mal com o bem. 
Primeiro, a mansidão consiste no suportar danos. Eu posso dizer desta graça, que ela não é conseguida facilmente. Um espírito submisso, como pano molhado, não pegará fogo facilmente.
“12 Também os que buscam a minha vida me armam laços e os que procuram o meu mal falam coisas que danificam, e imaginam astúcias todo o dia.
13 Mas eu, como surdo, não ouvia, e era como mudo, que não abre a boca.” (Sl 38.12,13).
Mansidão é a rédea da raiva. As paixões são inflamáveis, mas a mansidão é a água divina que as apaga. A mansidão é a rédea da boca, porque amarra a língua e lhe dá um bom comportamento.
A precipitação de espírito é oposta à mansidão.
“Não te apresses no teu espírito a irar-te, porque a ira repousa no íntimo dos tolos.” (Ec 7.9).
Quando o coração ferve em paixão e ira ele se encontra longe da mansidão. A raiva pode ser encontrada num homem sábio, mas ela descansa no coração dos tolos, e tem ali a sua morada. O homem iracundo é como pólvora, sempre pronto a entrar em chamas ao menor atrito.  .
A ira altera o estado de consciência tanto como o álcool o faz no que está embriagado. Assim o uso da razão é suspenso naquele que se deixa dominar pela ira.
Somente em alguns casos é justificado ficarmos irados. Há uma ira santa. Aquela ira sem pecado que é contra o pecado. Na qual mansidão e zelo podem estar juntos. Em assuntos de religião, um crente deve ser vestido com o espírito de Elias, e estar “cheio da ira do Senhor” (Jer 6.11).  Cristo era manso (Mt 11:29), contudo zeloso (João 2.14,15). O zelo da casa de Deus o consumiu. 
A malícia também é oposta à mansidão. A malícia é o retrato do diabo (Jô 8.44). Um espírito malicioso não é um espírito manso.
A disposição para se vingar também é oposta à mansidão. A vingança é um ofício para Deus e não para os homens. Por isso a Bíblia proíbe a vingança (Rm 12.19). Duelos espirituais são legais, quando consistem na luta contra o diabo (Tg 4.7), e com a parte carnal do homem, e abençoado é todo aquele que busca se vingar das suas luxúrias (II Cor 7.11). Mas outros tipos de duelos são ilegais. 
Passar por um dano sem vingança não traz qualquer descrédito à honra de um homem. Um espírito nobre negligencia um dano. 
Mas sem dúvida, um homem pode levar a espada para auto-preservação, quando outro vem a ele com o intuito de tirar-lhe a vida. Não o fazendo ele será culpado de suicídio. Levando a espada ele não procurará tanto a morte do outro, quanto a proteção da sua própria vida.
A auto-defesa, ou legítima defesa, como é mais conhecida, é consistente com a mansidão cristã.
Neste sentido os magistrados são ministros de Deus para vingarem o mal (I Pe 2.14; Rm 12.17), e assim, o exercício do ofício deles não é oposto à mansidão.
A maledicência também é oposta à mansidão. A maledicência sempre carrega a intenção de desprezar, ofender e difamar outros. Quando Paulo chamou os Gálatas de insensatos, a sua intenção não era a de ofendê-los e difamá-los, senão apenas de reformá-los.
Não é mansidão mas fraqueza separar-nos da nossa integridade (Jó 27.6). Deve haver mansidão cristã, como também prudência cristã. Ambas devem caminhar lado a lado. É legal sermos nossos próprios defensores em face de acusações injustas que possamos sofrer. Somente haverá falta quando nós replicarmos os danos procurando pagá-los na mesma moeda com que os sofremos.
Tendo considerado acerca da mansidão quanto ao seu aspecto de suportar danos, vejamos agora o relativo ao de se perdoar danos. Um espírito manso é um espírito perdoador.
Por natureza os homens são dados a esquecerem a bondade que recebem de outros, mas lembram-se com facilidade dos danos que sofreram. 
Mas Deus exige que sejamos como Ele, perdoando de coração e esquecendo os danos que sofremos (Mt 18.27).
Deus perdoa completamente todos os nossos pecados.  E um crente verdadeiramente manso também perdoa todos os danos dos seus ofensores.
Deus perdoa freqüentemente porque nós pecamos freqüentemente. Como Ele perdoa setenta vezes sete nos ordena também que façamos o mesmo.
É nosso dever estar sempre prontos para perdoar (Col 3.13) ainda que tenhamos que suportar aqueles que parecem mais monstros do que homens, porque não deixam de nos fazer o mal a par de todo o bem que lhe façamos. Mas nós cessaríamos de fazer o bem porque outros não cessaram de serem maus? Quanto mais danos perdoarmos mais brilhará a nossa graça. Se a algum crente falta esta virtude do perdão então lhe faltarão também as demais graças. Porque onde há uma graça, há todas as demais. Se a mansidão estiver faltando, o que haverá é apenas uma falsa corrente de graça. A fé será uma fábula, o arrependimento uma mentira, e a humildade, uma hipocrisia. 
E considerando que você diz que não pode perdoar, pense em seu pecado. Seu próximo não é tão ruim lhe ofendendo quando você é não lhe perdoando. Seu próximo, lhe ofendendo, transgride contra um homem, mas você, enquanto se recusa a lhe perdoar, peca contra Deus.
Também considere o perigo que você está correndo negando-se a perdoar, porque Deus tem disposto o dever de perdoar de tal maneira que as suas ofensas não serão perdoadas por Ele se você não perdoar as ofensas do seu próximo  (Mc 11.26).
O terceiro aspecto relacionado à mansidão é recompensar o mal com o bem. Este é um grau mais elevado do que o anterior.
A mansidão nos mostra o distintivo de um verdadeiro santo. Ele é de um espírito submisso, sincero. Ele não é provocado facilmente.
Quando o crente se dispõe a vencer o mal com a mansidão, Deus honra a sua obediência à sua Palavra, fazendo com que triunfe a causa do bem.
Deixe-me pedir a todos os cristãos para labutarem para serem eminentes nesta graça superior da mansidão.
“Buscai ao SENHOR, vós todos os mansos da terra, que tendes posto por obra o seu juízo; buscai a justiça, buscai a mansidão; pode ser que sejais escondidos no dia da ira do SENHOR.” (Sof 2.3).
Buscar insinua que nós podemos perder isto. Então, nó
 
s temos que fazer uma exibição pública depois de achá-lo. E isto faremos mostrando que estamos de fato vestidos com esta virtude cristã da mansidão (Col 3.12) e que nunca nos separaremos desta peça do vestuário divino.
A mansidão é necessária em tudo o que fizermos, especialmente quando
 
 
  estivermos instruindo outros no caminho da verdade (II Tim 2.25).
A mansidão conquista os oponentes da verdade. A mansidão derrete o coração.
A mansidão é necessária quando ouvimos a Palavra (Tg 1.21). Aquele que ouve o sermão ou instrução públicos com preconceito e sem mansidão, não adquire nenhum bem, mas feridas. Ele transformará vinho em veneno e se ferirá com a espada do Espírito. . 
“se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, corrigi-o com espírito de mansidão; olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado.” (Gál 6.1). No original grego, o verbo para corrigir é katartizo, katartizw , que significa emendar, tal como um cirurgião faz a união de um osso fraturado com o cuidado de não causar outras lesões ao ferido. 
Somos indesculpáveis se não buscarmos a graça da mansidão porque temos este exemplo fixado na Bíblia, na vida dos servos de Deus e na do próprio Cristo.
“Dizei à filha de Sião: Eis que o teu Rei aí te vem, Manso, e assentado sobre uma jumenta, E sobre um jumentinho, filho de animal de carga.”(Mt 23.5).
Jesus foi  insultado, mas não insultou os seus agressores (I Pe 2.23).
Ele nos ordena aprendermos do exemplo dEle de mansidão (Mt 11.29). Se nós não imitamos a vida dEle nós não podemos ser salvos pela Sua morte.
Moisés era o homem mais manso da terra (Nm 12.3). Quando os israelitas murmuravam contra ele em vez de se irar, ele intercedia em favor deles (Ex 15.24, 25).
A mansidão é um grande ornamento de um crente (I Pe 3.4). E quão agradável se torna aos olhos de Deus o crente que usa esta jóia preciosa. 
Deus poderia facilmente esmagar os pecadores e enviá-los logo ao inferno mas Ele modera a Sua ira porque embora esteja cheio de majestade, contudo está cheio de mansidão.
A mansidão forja um espírito nobre e excelente. Um homem manso é um homem valoroso. Ele adquire uma vitória sobre si mesmo. A paixão surge de imbecilidade e fraqueza, mas o homem manso pode conquistar a sua fúria.
Aquele que é tardio para se irar, isto é, que é longânimo, é melhor do que o poderoso, e do que aquele que conquista uma cidade (Pv 16.32).
Ser manso é nadar contra a natureza, é contrariá-la, e portanto é algo difícil de ser conquistado, e por isso este esforço merece se recompensado, e daí se dizer que os mansos herdarão a terra.  
A paixão faz um inimigo de um amigo. A mansidão faz um amigo de um inimigo.
É dito que o crente manso herda a terra porque ele herda a bênção da terra. O homem mau tem a terra, mas não como um fruto do favor de Deus.
O santo submisso desfruta a terra como um penhor do amor de Deus. A maldição e veneno é tirado da terra: “Mas os mansos herdarão a terra, e se deleitarão na abundância de paz.” (Sl 37.11).
Quando é dito que os mansos herdarão a terra, não significa que eles não herdarão mais do que a terra. Eles herdarão o céu também.
“Porque o SENHOR se agrada do seu povo; ornará os mansos com a salvação.” (Sl 149.4).
Assim a presença da mansidão é evidência de estar ocorrendo o trabalho da graça, porque a verdadeira graça inflama o amor e modera a ira.
  
“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça porque eles serão fartos.” (Mt 5.6).
 Nós chegamos agora ao quarto passo da bem-aventurança.
A fome e a sede espiritual são abençoadas porque é prometido que serão saciadas seguramente por Deus. Toda fome e sede relativa à justiça do reino de Deus serão saciadas.
A fome e a sede são desejos por alimento e água necessários para crescimento ou para a manutenção da vida. O pão e a água naturais provêm o sustento do corpo natural E o pão e a água espirituais provêm o sustento do corpo espiritual.
E qual é o significado da justiça referida por Jesus? É uma justiça dupla: uma que é imputada e outra que é implantada.
A justiça que é imputada é a relativa à nossa justificação. E a justiça é a do próprio Cristo que nos é imputada na justificação. Ela nos é atribuída pela nossa fé nEle. Em virtude desta justiça Deus olha para nós como se nunca tivéssemos pecado. Esta é uma justiça perfeita. É por causa desta justiça imputada que se diz em Col 2.10 que os crentes se encontram perfeitos em Cristo diante de Deus: “E estais perfeitos nele, que é a cabeça de todo o principado e potestade;” (Col 2.10).
E é por causa desta justiça imputada, que o crente terá fome daquela outra justiça que é implantada. Um justiça implantada se refere à retidão inerente à pessoa do crente, isto é, às graças do Espírito; à santidade do coração. Esta fome por esta justiça que é implantada comprova a existência da verdadeira vida espiritual. Um homem morto não pode ter fome. A fome procede da vida. A fome espiritual se seguirá ao novo nascimento (I Pe 2.2). Assim, sem esta fome espiritual não pode haver crescimento espiritual, porque somente os que têm fome se disporão a se alimentar do verdadeiro alimento espiritual.
Tudo que Deus requer de Seus filhos, para participarem do Seu banquete espiritual é que eles tragam apenas o seu apetite, porque Ele tem estabelecido um preço que é acessível a todos para obtenção das coisas divinas:
“1 Ó vós, todos os que tendes sede, vinde às águas, e os que não tendes dinheiro, vinde, comprai, e comei; sim, vinde, comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e leite. 2 Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão? E o produto do vosso trabalho naquilo que não pode satisfazer? Ouvi-me atentamente, e comei o que é bom, e a vossa alma se deleite com a gordura.” (Is 55.1,2).
Assim não nos é ordenado que compremos a justiça com dinheiro.
Se alguém convidar amigos à sua mesa, ele não espera que eles deveriam trazer dinheiro para pagar pelo jantar deles, mas que venham somente com apetite. Assim, o Senhor diz que não é penitência, peregrinação, farisaísmo que Ele requer. Traga somente seu estômago se você tem fome e sede de justiça.
O pecado tem um gosto doce para os ímpios porque eles não têm nenhuma fome espiritual de justiça. Eles estão cheios da sua própria justiça (Rm 10.3). E um estômago cheio recusa o favo de mel. Esta é a doença de Laodicéia. Ela estava cheia e não tinha nenhum estômago para valorizar o colírio e o ouro de Cristo (Apo 3.17).  
Quando os homens estiverem cheios com orgulho, esta doentia flatulência impedirá que tenham desejos santos por justiça. Não há ninguém que esteja tão vazio da graça como aquele que julga estar cheio.
A Palavra reprova aqueles que em vez de terem fome e sede de justiça, têm fome e sede de riquezas. Esta é a fome e a sede dos homens cobiçosos. A cobiça é idolatria (Col 3.5). Muitos crentes erigiram o ídolo de ouro no templo dos seus corações. O pecado mais difícil de se desarraigar é o da cobiça. Geralmente quando outros pecados deixarem os homens, este permanece.
E a cobiça, o amor ao dinheiro, é a raiz na qual nascem todos os males. E a cobiça não produzirá fome e sede de justiça, senão de toda sorte de injustiças.
Assim o problema não está em ser a fome e sede fracas, mas a ausência total delas. Uma fome e sede fracas é como um pulso que bate fraco, mas mostra que há vida. E estes desejos fracos não devem ser desencorajados porque há uma promessa feita a eles de que a cana quebrada não será esmagada pelo Senhor (Mt 12.20). Uma cana é algo fraco em si mesma, e quanto mais uma cana quebrada, entretanto não será esmagada e florescerá como a vara seca de Arão. Olhando em sua fraqueza para Cristo, Seu Sumo-Sacerdote será ajudado por Ele porque é paciente, poderoso e misericordioso.
Se você não tem aquele apetite como antigamente pelas coisas divinas, contudo não seja desencorajado, porque com o uso adequado dos meios da graça você pode recuperar seu apetite.
As riquezas não duram para sempre, mas a justiça dura para sempre e é por isso que os homens são exortados a trabalharem por este alimento que não perece, e não para ajuntar riquezas terrenas.
A menos que nós tenhamos fome de justiça nós não podemos obtê-la porque Deus nunca jogará fora as Suas bênçãos naqueles que não as desejam.
Assim como os exercícios físicos estimulam o apetite natural, de igual modo o exercício na piedade ( I Tim 4.7) estimula o apetite espiritual.
Aos que têm fome e sede de justiça Deus promete dar-lhes plenitude de fartura e daí se dizer que os tais são bem-aventurados porque serão aperfeiçoados na justiça que eles desejam como algo vital para a sua subsistência espiritual.
Quando a multidão não tinha nada para comer,  Cristo foi movido com compaixão e fez um milagre para a provisão deles (Mt 15.32). Muito mais será compassivo com os que têm fome e sede de justiça.
Deus saciará a alma faminta porque Ele mesmo incitou esta fome. Ele planta desejos santos em nós, e Ele não satisfaria esses desejos?
Deus satisfará o faminto porque a alma faminta é muito grata pela misericórdia. Deus ama dar a misericórdia dele onde ele pode ter um maior louvor. Nós nos encantamos em dar àqueles que são gratos.
Deus enche a alma faminta com plenitude de graça, paz e alegria.
Assim é de fato uma grande bem-aventurança ter fome e sede de justiça.
Considere por que Cristo recebeu o Espírito sem medida (João 3.34). Não foi para Si mesmo. Ele estava infinitamente cheio antes. Mas ele estava cheio com a unção santa para este fim, a saber, para  que ele pudesse derramar a graça dele na alma faminta. Você é ignorante? Cristo estava cheio com sabedoria para poder lhe ensinar. Você está sujo? Cristo estava cheio com graça para poder limpá-lo. A alma não virá então a Cristo que estava cheio para saciar o faminto?

“Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia.” (Mt 5.7).

Haveria necessidade de pregar sobre  misericórdia mais do que nestes tempos desapiedados em que nós vivemos?
Mas vejamos primeiro os vários tipos de misericórdia. 
O que é misericórdia? É uma disposição por meio da qual nós carregamos no coração as misérias de outros e estamos prontos em todas as ocasiões a sermos instrumentos para o bem deles. 
Em que o amor e a misericórdia diferem? 
Em algumas coisas eles concordam eles, em outras eles diferem, como águas de um rio que podem ter duas nascentes, mas se encontram no fluxo. O amor e misericórdia diferem nisto: o amor é mais extenso. O amor é um amigo constante que nos visita até mesmo quando estamos bem. A misericórdia é como um médico que só nos visita quando estamos doentes. O amor age mais por afeto. A misericórdia age mais por um princípio de consciência. A misericórdia empresta sua ajuda a outro. O amor dá seu coração a outro. Assim eles diferem, mas o amor e a misericórdia concordam nisto: ambos estão sempre prontos a prestarem bons serviços. 
A misericórdia procede de um trabalho da graça no coração. Por natureza, nós estamos bem longe da misericórdia. O pecador é uma oliveira brava e não uma oliveira que dá bom azeite. É o caráter e vocação do homem natural ser desapiedado (Rm 1.31).
Por natureza nós não produzimos azeite, mas veneno; não o óleo da misericórdia, mas o veneno da malignidade. 
Além desta falta de misericórdia inata que está em nós, há algo que é também infundido por Satanás. O príncipe das trevas trabalha no coração dos homens (Ef 2.2). E se ele domina os homens não é de se estranhar que eles sejam implacáveis e sem misericórdia. Que misericórdia pode ser esperada do inferno? De forma que, se o coração é afinado com a misericórdia, é por causa da mudança que a graça fez (Col 3.12).
Assim, antes de ser um homem misericordioso, é necessário ser uma nova criatura.
Nós devemos ser misericordiosos às almas de outros, especialmente das que não foram salvas. Realmente este é o principal tipo de misericórdia, porque a alma é a coisa mais preciosa que existe.   
Mais do que nós sentimos pela morte física de alguém, nós deveríamos sentir pela sua morte espiritual, porque este é o estado permanente de toda pessoa que não conhece a Cristo, e por sua morte eterna, que se seguirá ã sua morte física. 
O pecador sem Cristo está debaixo de uma horrível sentença de condenação eterna de um sofrimento eterno no fogo do inferno, e como não nos compadeceríamos da condição em que ele se encontra? Como deixaríamos de sentir preocupação pelo estado eterno da sua alma?  Como deixaríamos de lutar bravamente em intercessão pela salvação da sua alma?
Assim uma alma misericordiosa reprovará os pecadores refratários. Nós estaremos sendo misericordiosos quando lutarmos com eles pela salvação de suas almas e não permitirmos que eles desçam quietamente para o inferno. Se a casa de uma pessoa estivesse pegando fogo nós deixaríamos de lhe dar o devido aviso para não alarmá-la quanto ao prejuízo que estava sofrendo? E nós ficaremos calados vendo alguém dormir o sono da morte e o fogo da ira de Deus pronto a queimá-lo? 
Veja então como é um trabalho abençoado o trabalho do ministério! A pregação da Palavra nada mais é do que mostrar misericórdia às almas.
Ministros que toleram o pecado por temor de não ofenderem as pessoas são maus ministros. São ministros que não têm uma misericórdia verdadeira pelas almas perdidas. O cuidado deles é maior por dízimos do que por almas. Por realizações materiais do que por almas. Os tais são mercenários e não ministros de Cristo, e caso tenham tido uma chamada para o ministério, acabaram se desviando dela. Como podem ser chamados de pais espirituais aqueles que não possuem intestinos de misericórdia?
Tais homens não alimentam as almas das pessoas com verdades sólidas. Quando Cristo enviou os seus apóstolos, ele lhes deu o texto deles, e lhes disse o que eles teriam que pregar. Os ministros de Cristo devem pregar as coisas que pertencem ao reino de Deus. Eles são desapiedados  se em vez de repartir o pão da vida, encherem as cabeças das pessoas com especulações e noções vazias, que fazem apenas cócegas na consciência.
Há ministros que pregam como se eles estivessem falando uma língua desconhecida. Alguns ministros amam planar nas alturas como a águia e voam acima da capacidade das pessoas, e se esforçam bastante para serem mais admirados do que compreendidos.
É falta de misericórdia para com as almas pregar para não ser entendido. Ministros deveriam ser estrelas para dar luz, não nuvens para obscurecer a verdade.. É crueldade para com as almas quando nós andarmos para tornar as coisas fáceis difíceis. E muitos são culpados de subirem ao púlpito somente para exibirem a própria glória deles e divertirem as pessoas. Isto cheira mais a orgulho do que a misericórdia. 
Nós devemos também ser misericordiosos com os nomes de outros. Um bom nome é uma das maiores bênçãos na terra. Assim, é grande falta de misericórdia, uma grande crueldade, infamar o renome dos homens (Rom 3.13).
O homem orgulhoso e invejoso atacará a reputação de outros. E pensando em apagar os nomes que ataca, julga que o seu poderá brilhar mais do que os deles. O invejoso difama a dignidade dos outros, mas a Bíblia nos ensina a nos alegramos com a estima e fama de outros (Rm 1.8; Hb 11.2).
A calúnia é portanto uma grande demonstração de falta de misericórdia.
E a defesa do bom nome dos que são caluniados é uma grande demonstração de misericórdia.
E lembremos que Deus requererá em juízo cada palavra ociosa que foi proferida pelos homens, especialmente aquelas que foram usadas para infamar outros.
 Nós devemos ser também misericordiosos em relação às dívidas que outros tenham conosco e não tenham condições financeiras para saldá-las. Nós não podemos executar uma dívida que venha a colocar em risco a sobrevivência do nosso devedor (Dt 24.6).
Nós devemos ser também misericordiosos às ofensas de outros. Esteja pronto para mostrar misericórdia àqueles que o prejudicaram.
“A discrição do homem fá-lo tardio em irar-se; e sua glória está em esquecer ofensas.” (Pv 19.11).
Nós devemos ser misericordiosos às necessidades de outros. Considere os pobres; veja as lágrimas deles, os suspiros deles, os gemidos deles.
Considere por que o Deus sábio dispôs uma desigualdade no mundo. É por esta razão mesma, para que a misericórdia fosse exercitada. Se todos fossem ricos, não haveria nenhuma necessidade de esmolas, nem se poderia conhecer o homem misericordioso.
De forma que há sabedoria em considerar as necessidades de outros.
A palavra hebraica para misericórdia é hesed, C£Q£G , e significa intestino, entranhas. Isto indica que a misericórdia deve ser uma ação que provenha do nosso interior, que seja movida pelos nossos sentimentos de simpatia para com as necessidades de outros.
É um tipo de crueldade alimentar uma pessoa em necessidade e não simpatizar com ela.
A verdadeira religião gera ternura. Derrete o coração em lágrimas de contrição para Deus, em intestinos de compaixão por outros.
Deus demonstra a Sua misericórdia e cuidado com os pobres nos muitos mandamentos da Lei de Moisés que prescreveu para o benefício deles (Ex 23.11; Lev 19.9; 25.35; Dt 14.28,29 etc).
Na verdade Deus agrava o Seu juízo nos ricos mais do que nos pobres, porque se aos primeiros deu confortos e facilidades neste mundo, no entanto pesou muito sobre eles a responsabilidade de assistirem aos necessitados com suas riquezas, e na medida que não o fazem agravando a pobreza no mundo, sofrerão um maior juízo de condenação. No entanto, o pobre não foi cumulado com este peso de responsabilidade da parte de Deus, e nisto tem uma grande vantagem em relação aos ricos, e assim não houve nenhuma injustiça da parte de Deus em ter disposto a criação de tal sorte que houvesse pobres e ricos no mundo.    
A lâmpada da fé deve estar cheia do azeite da caridade. Somente a fé justifica mas a fé justificadora não está só. Embora as boas obras não sejam a causa da salvação, contudo elas são evidências da salvação. Embora elas não sejam o fundamento contudo elas são a estrutura. Não deve ser edificada uma fé em obras, mas devem ser edificadas obras em fé. 
As boas obras são a pedra de toque da fé (Tg 2.18).
Estes frutos das boas obras adornam a árvore da justiça. Assim deixe a liberalidade da sua mão ser o ornamento da sua fé.
Pelo menos em dois aspectos as boas obras são em algum senso, mais excelentes do que a fé. Porque  elas são de uma natureza diferente mais nobre.  Embora a fé seja mais necessária para nós mesmos, contudo as boas obras são mais benéficas a outros. A fé é uma graça receptiva. As boas obras são para o bem de outros, e é uma coisa mais abençoada dar do que receber. 
A fé é uma graça mais oculta. As boas obras são mais visíveis. A fé pode permanecer escondida no coração e pode não aparecer, mas quando são unidas boas obras à fé, ela brilhará diante dos homens e trará glória ao Senhor.
Há alguns que talvez darão boas palavras aos pobres e isso é tudo. Palavras são boas mas são um tipo frio de caridade. O pobre não pode viver deste ar. Deixe suas palavras serem tão suaves quanto o óleo, e elas não curarão as feridas. Deixe que elas fluam como o favo de mel, e elas não alimentarão o faminto.

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